“Quero ver o direito brotar como fonte e correr a
justiça qual riacho que não seca”
(Amós 5,24)
Diante
das eleições municipais que ocorrerão no dia 2 de outubro deste ano, a
Conferência Nacional dos Bispos do Brasil – CNBB dirige ao povo brasileiro uma
mensagem de esperança, ânimo e coragem. Para todos, especialmente para os
cristãos, as eleições municipais são oportunidade de darmos a razão de nossa
esperança (cf. 1Pd 3,15), sobretudo, nesse tempo de profunda crise pela qual
passa o Brasil.
.Sonhamos
com um país próspero, democrático, sem corrupção, socialmente igualitário,
economicamente justo, sem violência nem discriminação, com oportunidades iguais
para todos. Só com a participação cidadã de todos os brasileiros e brasileiras
é possível a realização deste sonho. Esta participação democrática começa no
município onde cada um mora e constrói sua rede de relações. Se queremos
transformar o Brasil, comecemos por transformar os municípios. E as eleições
são um dos caminhos para atingirmos a meta.
A
política, do ponto de vista ético, “é o conjunto de ações pelas quais os homens
buscam uma forma de convivência entre indivíduos, grupos, nações que ofereçam
condições para a realização do bem comum”. Já do ponto de vista da organização,
a política é o “exercício do poder e a luta por conquistá-lo”, exercendo-o na
perspectiva do serviço.
Aos
cristãos, de maneira singular, cabe a exigência evangélica de construir o bem
comum. Contribui para isso a participação consciente no processo eleitoral,
escolhendo e votando nos melhores candidatos. A cidadania, no entanto, não se
esgota no direito-dever de votar, mas se dá também no acompanhamento do mandato
dos eleitos, associando fé e vida.
O
divórcio entre fé e vida compromete a busca do bem comum como já o afirmara São
João Paulo II: “Para animar cristãmente a ordem temporal, no sentido que se
disse de servir a pessoa e a sociedade, os fiéis leigos não podem absolutamente
abdicar da participação na política, ou seja, da múltipla e variada ação
econômica, social, legislativa, administrativa e cultural, destinada a promover
orgânica e institucionalmente o bem comum”. Além disso, adverte o Concílio
Vaticano II que o “divórcio entre a fé que professam e o comportamento
cotidiano de muitos devem ser contado ente os mais graves erros de nosso
tempo”. É imperioso afirmar, nesse contexto, que a corrupção se dá também no
vazio da participação.
As
eleições municipais têm uma atração e uma força próprias pela proximidade dos
candidatos com os eleitores. Se, por um lado, isso desperta mais interesse e
facilita as relações, por outro, pode levar a prática condenáveis como a compra
de votos, a divisão de famílias e da comunidade. Na política é fundamental
respeitar as diferenças e não fazer delas motivo para inimizades ou
animosidades que desemboquem em violência de qualquer ordem.
Para
escolher e votar bem é imprescindível conhecer, além dos programas dos
partidos, os candidatos e sua proposta de trabalho, sabendo distinguir
claramente as funções para as quais se candidatam. Dos prefeitos, no poder
executivo, espera-se “conduta ética nas ações públicas, nos contratos
assinados, nas relações com os demais agentes políticos e com os poderes
econômicos”. Já dos legisladores, os vereadores, requer-se “uma ação correta de
fiscalização e legislação que não passe por uma simples presença na bancada de
sustentação ou de oposição ao executivo”.
É
preciso estar atento aos valores das campanhas. O gasto exorbitante, além de
afrontar os mais pobres, contradiz o compromisso com a sobriedade e
simplicidade que deveria ser assumido por empresas, aplicada pela primeira vez
nessas eleições, devolve ao povo o protagonismo eleitoral, submetido antes ao
poder econômico. Além disso, estanca uma das veias mais eficazes de corrupção,
como atestam os escândalos noticiados quase cotidianamente pela imprensa. Da
mesma forma, é preciso combater, sistematicamente, a vergonhosa prática de
“Caixa 2”, tão comum nas campanhas eleitorais.
A
compra de votos, ainda presente em muitos municípios, e o uso da máquina
administrativa nas campanhas constituem crime eleitoral que atenta contra a
honra do eleitor e contra a cidadania. Exortamos os eleitores a fiscalizarem os
candidatos e, constatando esse ato de corrupção, denunciem os envolvidos ao
Ministério Público e à Justiça Eleitoral, conforme prevê a Lei 9840, uma
conquista da mobilização popular há quase duas décadas.
A
vida pregressa dos candidatos também não pode ser esquecida. È fundamental
considerar o passado do candidato, sua conduta moral e ética e, se já exerce
algum cargo político, conhecer sua atuação na apresentação e votação de
matérias e leis a favor ou contra o povo. A Lei da Ficha Limpa há de ser neste
caso, o instrumento iluminador do eleitor para barrar candidatos de ficha suja.
Após
as eleições, é importante a comunidade se organizar para acompanhar os mandatos
dos eleitos. Os cristãos leigos e leigas, inspirados na fé que vem do
evangelho, devem se preparar para assumir, de acordo com sua vocação,
competência e capitação, serviços nos conselhos de participação popular como da
Educação, Saúde, Criança e Adolescente, Juventude, Assistência Social etc.
Devem, igualmente, acompanhar as reuniões das Câmaras Municipais onde se votam
projetos e leis para o município. Estejam atentos à elaboração e implementação
de políticas públicas que atendam, especialmente, as populações mais
vulneráveis como crianças, jovens, idosos, e os pobres. Neste ano, cobre-se de
forma mais intensa a elaboração do Plano Municipal de Saneamento Básico,
conforme proposta da Campanha da Fraternidade Ecumênica, que nos convoca a
cuidar da casa comum.
Uma
boa maneira de conhecer os candidatos e suas propostas é promover debates entre
os concorrentes. Em muitos casos cabe, inclusive, propor aos candidatos a
assinatura de cartas-compromissos em relação a alguma causa relevante para a
comunidade como, por exemplo, a defesa do direito de crianças e adolescentes.
A
Igreja não assume nenhuma candidatura, mas ajuda no discernimentos dos melhores
candidatos, que tenham compromisso com a vida, com a justiça, com ética, com a
transparência, com o fim da corrupção. Por isso, exortamos as comunidades a
aprofundarem seu conhecimento sobre a vida política de seu município e no país,
fazendo sempre a opção por aqueles que se proponham a governar a partir dos
mais pobres, não se rendendo à lógica da economia de mercado.
Confiamos
que nossas comunidades saberão se organizar para tornar as eleições municipais
ocasião de fortalecimento da democracia que deve ser, cada vez mais,
participativa. Nosso horizonte seja sempre a construção do bem comum.
Que
Nossa Senhora Aparecida, Mãe e Padroeira dos brasileiros, nos acompanhe e
auxilie no exercício de nossa cidadania a favor de nossos municípios, onde
começa a democracia, e do Brasil.